Resumo:
No cérebro, várias regiões estão associadas ao processo de empatia, formando uma rede neural complexa. Este estudo fornece uma nova perspectiva sobre como a interação entre experiência pessoal e atividade cerebral molda o comportamento social, enfatizando a complexidade das conexões entre empatia, biologia e comportamento.
Nossa experiência pessoal com eventos emocionais impacta profundamente a maneira como percebemos e reagimos às emoções de outras pessoas. Empatia é a capacidade de compreender e compartilhar os sentimentos de outra pessoa, seja alegria, tristeza ou dor.
Trata-se de um mecanismo fundamental para a conexão social, permitindo que os indivíduos respondam de maneira apropriada às emoções e necessidades dos outros.
A empatia envolve dois componentes principais: o cognitivo, que é a habilidade de entender a perspectiva ou situação do outro, e o emocional, que é sentir ou refletir as emoções alheias. No cérebro, várias regiões estão associadas a esse processo, formando uma rede neural complexa.
A área central na empatia é o córtex pré-frontal medial (mPFC), que desempenha um papel crucial no processamento de pensamentos sobre os outros e na regulação das emoções. Além disso, o córtex cingulado anterior (ACC) e a ínsula anterior são fundamentais para perceber e responder à dor e às emoções negativas dos outros.
Já a amígdala, uma estrutura profundamente enraizada no sistema límbico, está associada ao reconhecimento de emoções e ao processamento de reações emocionais intensas, como medo ou sofrimento. Por sua vez, o córtex parietal inferior contribui para a capacidade de "se colocar no lugar do outro", essencial para a empatia cognitiva.
Essas áreas trabalham em conjunto para integrar informações emocionais e contextuais, permitindo respostas comportamentais empáticas. Distúrbios em qualquer uma dessas regiões podem impactar negativamente a empatia, como observado em condições como autismo, psicopatia ou transtorno de estresse pós-traumático (TEPT).
Este estudo, realizado por pesquisadores do Institute of Neuroscience, National Research Council, Vedano al Lambro na Italy, investigou como os camundongos, após vivenciarem uma experiência negativa, respondem ao estresse em outros camundongos e revelou descobertas intrigantes sobre as bases biológicas e comportamentais dessa interação.
Os pesquisadores observaram que camundongos reagem de maneira distinta ao estresse alheio, exibindo preferências ou evitando seus semelhantes em sofrimento, mas somente quando eles próprios já passaram pelo mesmo evento traumático ou aversivo.
Em outras palavras, a experiência direta de um evento estressante é um fator crucial para moldar sua resposta ao estado emocional dos outros. Esses comportamentos divergentes foram influenciados por fatores biológicos específicos: nas fêmeas, as reações variavam dependendo do ciclo estral, enquanto nos machos, a dominância social desempenhava um papel importante.
Os cientistas investigaram a atividade do fator de liberação de corticotropina (CRF), uma molécula envolvida na resposta ao estresse, dentro de uma região específica do cérebro, o córtex pré-frontal medial (mPFC).
Quando a expressão de CRF no mPFC foi silenciada, os camundongos demonstraram uma redução significativa na influência da experiência pessoal de estresse sobre suas reações ao estresse de outros.
Isso sugere que o CRF desempenha um papel crucial na mediação de comportamentos empáticos, como a preferência ou evitação.
Imagens de cálcio realizadas com microendoscopia em camundongos vivos permitiram que os pesquisadores monitorassem a atividade neuronal no mPFC em tempo real.
A imagem acima mostra um exemplo de um filme neuronal criado com imagens de cálcio. Fonte: Professor Dorit Hochbaum. UC Berkeley
Eles descobriram que os neurônios que expressam CRF eram mais ativados em resposta ao estresse dos outros somente quando os camundongos já haviam passado por experiências aversivas semelhantes.
Esse achado demonstra que a experiência emocional pessoal amplifica a sensibilidade neuronal ao sofrimento alheio.
Usando manipulações optogenéticas, uma técnica que permite ativar ou desativar neurônios específicos com luz, os pesquisadores confirmaram que a maior ativação dos neurônios CRF no mPFC era responsável pela mudança no comportamento dos camundongos.
Exemplo da Tecnica de Optogenetica
Após vivenciarem uma experiência negativa, esses animais mudavam sua abordagem: de inicialmente buscar conforto na proximidade dos outros em sofrimento (preferência) para evitá-los, possivelmente como forma de autopreservação.
Esses resultados destacam a existência de um substrato neurobiológico que explica como as experiências emocionais de um indivíduo podem influenciar sua capacidade de se conectar com outros em estados emocionais negativos.
Isso não apenas amplia nossa compreensão dos mecanismos biológicos subjacentes à empatia e ao comportamento social, mas também pode ter implicações para o estudo de transtornos psiquiátricos em que essas interações são prejudicadas, como o autismo, o TEPT e a depressão.
Este estudo fornece uma nova perspectiva sobre como a interação entre experiência pessoal e atividade cerebral molda o comportamento social, enfatizando a complexidade das conexões entre empatia, biologia e comportamento.
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Self-experience of a negative event alters responses to others in similar states through prefrontal cortex CRF mechanisms
Federica Maltese, Giada Pacinelli, Anna Monai, Fabrizio Bernardi, Ana Marta Capaz, Marco Niello, Roman Walle, Noelia de Leon, Francesca Managò, Felix Leroy & Francesco Papaleo
Nature Neuroscience (2024). 03 December 2024
Abstract:
Our own experience of emotional events influences how we approach and react to others’ emotions. Here we observe that mice exhibit divergent interindividual responses to others in stress (that is, preference or avoidance) only if they have previously experienced the same aversive event. These responses are estrus dependent in females and dominance dependent in males. Notably, silencing the expression of the corticotropin-releasing factor (CRF) within the medial prefrontal cortex (mPFC) attenuates the impact of stress self-experience on the reaction to others’ stress. In vivo microendoscopic calcium imaging revealed that mPFC CRF neurons are activated more toward others’ stress only following the same negative self-experience. Optogenetic manipulations confirmed that higher activation of mPFC CRF neurons is responsible for the switch from preference to avoidance of others in stress, but only following stress self-experience. These results provide a neurobiological substrate underlying how an individual’s emotional experience influences their approach toward others in a negative emotional state.
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